Em Os cento e vinte dias, o libertino se declara excitado
não pelos “objetos que aqui estão”, mas pelo Objeto que não está ali, quer
dizer a “idéia do mal”. Ora, essa idéia de algo que não está, essa idéia do Não
ou da negação, que não é dada nem possível de ser dada na experiência, só pode
ser objeto de demonstração (no sentido em que o matemático fala de verdades que
guardam todo seu sentido mesmo se dormirmos, e mesmo não existindo na
natureza). É o porquê também dos heróis sádicos desesperarem e se enfurecerem
vendo seus crimes tão magros comparados àquela idéia que eles só conseguem
atingir através da onipotência do raciocínio. Sonham com um crime universal e
impessoal ou, como diz Clairwil, com um crime “cujo efeito perpétuo aja, mesmo
quando eu não mais agirei, de forma que não se passe mais um só instante da
minha vida em que, mesmo dormindo, eu não seja a causa de uma desordem
qualquer”.
G. Deleuze
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