sábado, 22 de outubro de 2011

Amanheço

O sol visto da janela do meu quarto. Esplêndido. Mesmo na condição patética dos primeiros dias, pude admirar a luminosidade indescritível das tardes de verão. A cidade parece tomada por uma onda de calmaria e as pessoas se esforçam para que eu sinta vontade de ficar; de ser. A cidade se abre para mim, macia. Receptiva. Coberta por um véu de suave devoção. Sento no café. Venço a minha impaciência com o barulho e as pessoas. As pessoas que fazem menos barulho para ouvir o piano. O piano. Lamento não saber tocar nenhum instrumento. Adormeço no colo da música. Viva. Consigo olhar esse Deus sátiro nos olhos. Aqui, sou mais cínica diante de tudo aquilo que é falho; da vida. Termino de comer. E sou atingida por um raio. Meu passo se atrasa e se apressa. Um calafrio que atravessa o meu corpo e traz inquietude para cada músculo. É o abismo da felicidade. É o amor cavalgando o meu dorso. Um quê de divindade nas nossas entranhas. Tu és um Deus e nunca houve nada mais divino. Amor fati. A fortuna da minha existência está nas fatalidades. A mulher que olha dentro dos meus olhos e promete o melhor café que já fez. Dia perfeito em que tudo amadurece. Um raio. Eu, como você, morri. Eu, como você, estou viva. E envelheço nas minhas decisões. Envelheço tentando domar cada elemento vital do meu corpo. Renasço. Danço. Trago o encantamento e a felicidade, que deixaram o berço dilacerado pela dor. Tu te tornas obra de arte. Tu dizes sim ao mundo. E a cidade se alegra por estarmos aqui. E a cidade se alegra por suportarmos tanta verdade sem sucumbir.

Por Daniela Lima
Fonte : Cronópios

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