Eu te cantei canções de amor
enquanto eles nos jogaram
juntos
entre as baratas e os ratos
no porão do navio negreiro.
Eu te cantei canções de amor
quando naquele buraco fétido
eu te ajudei a ficar vivo
para enfrentar a luta no novo mundo.
Eu te cantei canções de amor
quando eles nos colocaram
à venda no leilão
e te levaram para o leste
me arrastando para o norte.
Eu te cantei canções de amor
entre os meus gritos
de dor
te implorando
Por favor nunca te esqueças de mim.
Eu te cantei canções de amor
quando eles me levaram
para ser sua concubina
e te levaram
para ser seu garanhão.
Eu te cantei canções de amor
até quando eu deixei
de ser a concubina deles
mas não pudeste deixar de ser
seu garanhão.
Eu te cantei canções de amor
quando a backra-massa ¹
nos jogou pra fora de nossas terras
pagas com nosso suor e sangue.
Eu te cantei canções de amor
quando tu disseste
“Se não podemos vencê-los
vamos nos unir a eles”
e ficaste com a backra-missus ².
Eu te cantei canções de amor
quando tivemos nossas cabeças
quebradas
juntos
nas demonstrações pelo direito
de falar, de fazer greve
de politizar
de organizar.
Eu te cantei canções de amor
quando tu choraste no meu peito
e eu esfreguei ervas medicinais
nos teus ferimentos
ambos
esquecendo
que os meus próprios intestinos estavam rasgados
e rasgados de feridas.
Eu te cantei canções de amor
quando pegamos em armas
contra o inimigo
para resgatar nossa dignidade.
Eu te cantei canções de amor
mesmo quando tu renegaste
o nosso filho
concebido com a tua semente apressada
disparada no meu útero
num dia de folga.
Eu te cantei canções de amor
depois da guerra
quando trabalhamos juntos
para reconstruir um povo inteiro
e um país livre.
Eu te cantei canções de amor
quando tu me disseste
que eu já não era esperta o suficiente
para freqüentar os jantares de Estado
para os quais tu já eras convidado.
Eu continuo te cantando
canções de amor
mesmo quando canções de ódio
ameaçam sufocar até a minha alma.
Eu te canto canções de amor
homem-negro
para que tu possas entender
que eu te quero
forte
do meu lado
me cantando canções de amor também.
Elean Thomas (1947-2007); Jamaica.
In: BARON, Dan. Alfabetização cultural. São Paulo: Alfarrábio, 2004. (Tradução do autor)
Notas:
¹ O latifundiário na Jamaica.
² A esposa do latifundiário
Nenhum comentário:
Postar um comentário