16/06/2015 00h01 Thaís Aranda Barrozo
Recentemente, dez entre dez notícias sobre o fim da greve
dos professores da rede estadual de ensino no Paraná vinculam-no à declaração,
pelo Judiciário, da “ilegalidade” do movimento. A informação, bem palatável, é
reforçada pela manutenção da multa de R$40 mil por dia, aplicada pelo Tribunal
de Justiça do Paraná (TJ-PR) à APP-Sindicato caso os professores não voltassem
às salas de aula (decisão proferida em 2 de junho no Ag.Reg. 1348213-8/01, de
relatoria do desembargador Luiz Mateus de Lima).
Seguiu-se à decisão do TJ a aprovação do fim da greve dos
professores, mediante a promessa da aprovação de lei que lhes concederá, em
outubro de 2015, reposição salarial de meros 3,45%. Os acontecimentos foram
noticiados quase terminando com um “... e foram todos – governo, professores e
alunos – felizes para sempre”.
A verdade, contudo, é que o TJ/PR em momento algum ousou
afirmar a ilegalidade da greve na decisão proferida em 2 de junho. Nela,
afirmou o Judiciário que “embora o movimento grevista em apreço seja legítimo,
bem como pautado na legalidade, [...] entendo que as atuais circunstâncias
fáticas autorizam [...] determinar a cessação do exercício de greve”.
Justificou-se dizendo que “ainda que o interesse da categoria envolvida seja
legítimo e pautado na legalidade, deve prevalecer o direito
essencial/fundamental à educação”. O argumento funda-se, portanto, na
prevalência do interesse público na continuidade dos serviços de educação em
relação àqueles dos professores (como se a pauta de reivindicações dos
professores não fosse, também, de interesse público).
Transferiu-se aos professores o ônus de arcar com a conta
institucional de promover aos cidadãos paranaenses o direito à educação
E disse mais o Judiciário. Afirmou que “no meio do impasse
ora instaurado, no qual se discute interesses de uma categoria (servidores
públicos, no caso professores) abalados pela notória crise financeira dos
cofres públicos (decorrente do descontrole das contas públicas em virtude de
gestões ineficientes), encontra-se, à deriva, o direito à educação, sendo que
os maiores prejudicados são as famílias e os estudantes, os quais estão sendo
privados do acesso a tal direito”.
Como se vê, a greve da APP não foi declarada ilegal pelo
Judiciário. Este a afirmou legal e legítima, apontando o rombo dos cofres
estaduais, “decorrente do descontrole das contas públicas, fruto de gestões
ineficientes”, como causa do impasse.
O que choca, no entanto, foi a solução dada ao conflito: a
APP foi condenada à cessação da greve, legal e legítima, sob pena de multa (R$
40 mil por dia!), sem que nada fosse dito ao Estado quanto ao seu dever
institucional de realizar política pública eficiente à concretização do direito
fundamental social à educação. Em suma: transferiu-se aos professores o ônus de
arcar com a conta institucional de promover aos cidadãos paranaenses o direito
à educação, à custa de seus próprios direitos fundamentais sociais ao trabalho
e à recomposição salarial.
Eu sabia que lecionar é sacerdócio. Não sabia que, para o
Judiciário paranaense, é escravidão.
Thaís Aranda Barrozo, advogada e doutoranda em Direito
Processual pela USP, é professora do curso de Direito da UEL.
Gazeta do Povo
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