Lev Tolstói:
“Quando ouço dizer que em qualquer uma das guerras
rebentadas a culpa é exclusivamente de uma das partes, nunca posso aceitá-lo. É
possível reconhecermos que uma parte aja pior do que outra, mas uma discussão
sobre qual delas age pior nunca será capaz de esclarecer nem a razão mais
superficial de estar acontecendo algo tão horroroso, cruel e desumano como a
guerra. As respectivas causas, três no total, são evidentes para qualquer
pessoa que mantenha os olhos bem abertos: a 1ª
é a distribuição desigual de bens, quando alguns indivíduos roubam os
outros; a 2ª é a existência de militares
que são educados e predestinados para matar; a 3ª é a doutrina religiosa, falsa e, na maior parte
das vezes, conscientemente enganosa, que está sendo impingida às novas gerações.”
(De uma carta para G. Volkonski, datada de 4 de dezembro de
1899)
Tolstói foi um dos maiores pacifistas na história russa. Foi
a participação na guerra que o mudou. Ele esteve na defesa de Sebastopol,
durante a guerra da Crimeia de 1853 e 1856, bem como na campanha militar de
subjugação dos povos do Cáucaso. Graças a sua experiência pessoal, chegou à
negação absoluta de qualquer assassinato e, como consequência, até da Igreja e
do Estado, além de muitos dos institutos sociais existentes naquela altura.
Fiódor Dostoiévski:
“Em certos casos, se não em quase todos, excluindo, talvez,
apenas as guerras civis, qualquer guerra é um processo através do qual
(precisamente com o mínimo derramamento de sangue, a mínima mágoa e os mínimos
esforços) se consegue a paz internacional e são elaborados relacionamentos mais
ou menos normais entre as nações. (…) O que mais está enfurecendo e exasperando
o homem é a paz, sobretudo quando é prolongada, e não a guerra. (…) Uma guerra
provocada por uma causa benévola, pela libertação dos oprimidos, por uma ideia
desinteressada ou santa – uma guerra destas apenas está limpando o ar social,
poluído pelos miasmas acumulados, e cura as almas, acabando com as vergonhosas
covardias e preguiças, dá e esclarece uma ideia, à realização da qual é
destinada uma ou outra nação. Uma guerra destas está fortalecendo todas as
almas com o espírito de autossacrifício, além de o ânimo de toda a nação ser
fortificado através da consciência solidária e a união de todos os cidadãos
integrados numa nação.”
(“Diário de um Escritor”, 1876 – Abril, capítulo 1.º, p.
III: O Sangue Derramado Salva?)
Em 1877, a Rússia declarou guerra à Turquia. Além das razões
políticas, essa guerra tinha uma ideia profunda: na Rússia, foi e é vista como
uma ajuda fraternal aos povos búlgaro e sérvio, subjugados pelos turcos. No ano
anterior à guerra e no primeiro ano da mesma, Dostoiévski publicou artigos de
uma coletânea intitulada “Diário de um Escritor”, em que refletiu muito sobre a
guerra, bem como sobre a política europeia em geral.
Estas obras de Dostoiévski como publicista, de um século e
meio atrás, têm semelhanças impressionantes com as análises políticas que hoje
em dia se encontram na internet: o mesmo ardor, rispidez na apreciação,
inclinação para previsões e prognósticos. Ainda antes do início das ações
bélicas, Dostoiévski falou sobre a possibilidade de uma guerra surgir sem
declaração oficial, com participação de formações voluntárias, o que nos lembra
a situação atual no sudeste da Ucrânia.
Aleksandr Blok:
“Não tenho medo de balas. No entanto, a guerra e tudo
relacionado com ela é uma brutalidade. Foi o que me tentava apanhar desde o
liceu, se manifestando de formas variadas, e, enfim, me apertou a garganta.
Ninguém devia sentir o cheiro de um capote de soldado.”
(O diário, 28 de junho de 1916)
Na fase inicial da Primeira Guerra Mundial, os russos a
encaravam com o entusiasmo, os literatos requintados se alistavam no Exército
ou estavam escrevendo poemas cheios de patriotismo mais sincero. Aleksandr
Blok, representante mais notável do “Século de Prata” da poesia russa, tinha
uma posição à parte, sentindo uma repugnância à guerra, por perceber que ela
sempre levava a uma explosão social. Após a revolução de 1917, o poeta faz
tentativas amarguradas de se adaptar à nova realidade “brutal”, procurando nela
uma fonte saudável e purificante. Os tais esforços o levaram ao extremo
desespero e à morte prematura.
Boris Paternak:
“Deveríamos enaltecer e espiritualizar nossa atualidade,
para darmos mais valor a todos dias que vivemos, para evitarmos desperdiçá-los
ou perdê-los em vão, para a vida se tornar tão atraente, espiritual e cheia de
inspirada beleza que não reste nenhuma vontade devastadora de assassínio ou
suicídio. Não sei nem posso imaginar outro meio de resistirmos à guerra.”
(Cartas, 10º volume)
Durante a época do poder soviético, a propaganda usava o
slogan oficioso de “luta pela paz”. Os escritores destacados participavam
frequentemente das iniciativas organizadas sob este lema. Um escritor podia
exprimir seus pensamentos sobre a guerra, sem ênfase demonstrativa ou floreados
ideológicos obrigatórios, apenas mediante o diário ou a correspondência
particular.
Na citação acima ouvimos entonações tolstoianas, e não é por
acaso. Seu romance “Doutor Jivago”, que contribuiu para Boris Pasternak ganhar
Prêmio Nobel de Literatura, às vezes faz eco a “Guerra e Paz” de Tolstói. Numa
outra carta, encontramos a opinião oposta de Pasternak:
“A guerra exerceu uma ação infinitamente libertadora sobre
meu estado geral, saúde, capacidade de trabalho e percepção de destino”. Em
prol da verdade se diga que Pasternak não participou nem da Primeira, nem da
Segunda Guerra. A sua maneira de encarar a luta armada foi inspirada pelas
emoções e pelo temperamento poético, em vez da experiência própria.
Aleksandr Soljenítsin:
“Nenhuma guerra é solução. A guerra é a morte. O horror da
guerra consiste não no avanço das tropas, nem nos incêndios, nem nos
bombardeios. Antes de mais, a guerra é horrorosa porque entrega tudo que há de
raciocinativo ao poder legal da inépcia (…) Aliás, sem guerra também lá estamos
nós.”
(Romance “O Primeiro Círculo”, 1958)
Soljenítsin, ex-oficial do Exército, mandado para a prisão
da linha de frente da batalha, sendo depois colocado num campo de concentração
estalinista, profere a sentença bem clara contra a guerra em que participa o
Estado totalitário, apesar de se tratar de uma resistência e contraposição ao
agressor: “Qualquer situação bélica serve apenas para justificar uma tirania
interna, fortalecendo-a.”
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