Atos institucionais pós-golpe de 64 elevam total de magistrados
e aposentam Evandro Lins e Silva, Hermes Lima e Victor Nunes Leal. Entulho
autoritário só acabou nos anos 80
17 de Janeiro de 1969, Geral,
Atentado dos Guararapes. O vice-almirante Nelson Fernandes,
diretor da Chesf, morto após a explosão de bomba no aeroporto do Recife, onde
desembarcaria o marechal Costa e Silva, sucessor de Castello Branco na
Presidência da República
Matheus Guedes*
Criado em 1890, o Supremo Tribunal Federal (STF) surgiu com
a responsabilidade de ser a instância máxima de um dos três poderes
recém-instituídos pela República, o Judiciário. E assim permaneceu até 9 de
abril de 1964, data da promulgação do primeiro dos Atos Institucionais (AIs)
impostos pela ditadura militar. Ele permitia ao governo que derrubara o
presidente João Goulart demitir ou aposentar os magistrados. Era o início de
uma escalada de sanções que chegaria ao seu ápice com o AI-5, de 1968, e a
aposentadoria compulsória de Evandro Lins e Silva, Victor Nunes Leal e Hermes
Lima, ministros do STF. No ano seguinte, viria o AI-6, que transferia ao
Superior Tribunal Militar (STM) o poder de julgar em caráter definitivo aqueles
que se opusessem ao regime.
Apesar de o AI-1 permitir que o governo pudesse arbitrar
sobre a composição do Supremo, a ditadura não atuou de fato até baixar o
segundo Ato. Baseado na Constituição de 1934 criada no governo Getúlio Vargas,
o AI-2, de 27 de outubro de 1965, aumentava de 11 para 16 o total de ministros
do STF e tinha, segundo opositores na época, a intenção de enfraquecer a
instituição. Embora permitido, nem na época da ditadura de Vargas durante o
Estado Novo (1937-45) o aumento do número de ministros foi instituído.
Mas foi em 13 de dezembro de 1968, com o AI-5, que a
ditadura iniciou sua fase mais autoritária. Com ele, o presidente Artur da
Costa e Silva aposentou compulsoriamente os ministros Evandro Lins e Silva,
Vitor Nunes Leal, que também seria afastado de seu cargo na UFRJ, e Hermes
Lima. Em solidariedade, os também ministros Lafaiete de Andrade e Antônio
Gonçalves de Oliveira pediram aposentadoria. Além das destituições, Costa e
Silva retirou o poder do tribunal de conceder habeas corpus nos casos de
“crimes políticos contra a segurança nacional, a ordem econômica e social e a
economia popular”, dando mais poderes à Justiça Militar.
Hoje todos falecidos, os ministros cassados haviam ocupado
cargos de destaque antes da ditadura. Lins e Silva fora procurador-geral da República
entre 1961 e 1963, chefe de Gabinete da Presidência em 1963 e ministro das
Relações Exteriores, no mesmo ano. Nunes Leal, por sua vez, chefiou o gabinete
do presidente Juscelino Kubitschek, entre 1956 e 1959, e se tornou consultor
geral da República em 1960. Já Lima, dono de vasto currículo, foi deputado
federal pelo Distrito Federal entre 1946 e 1951 (à época, na cidade do Rio de
Janeiro), chefe do Gabinete da Presidência nos governos de Jânio Quadros e
Jango, entre 1961 e 1962, ministro do Trabalho em 1962 e das Relações
Exteriores entre 1962 e 1963, além de primeiro-ministro do país entre 1962 e
1963.
Após a saída dos cinco ministros, o governo militar impôs o
Ato nº 6, em 1º de fevereiro de 1969. Com ele, os poderes da Justiça Militar
aumentavam ainda mais e era restabelecido o número de 11 ministros. Cabia ao
STM, a partir de então, o julgamento em última instância dos civis processados
nos casos de “crimes contra a segurança nacional ou as instituições militares”.
O STF não tinha mais o poder de julgar estes réus em recurso. Foi o tiro de
misericórdia da ditadura na instituição mais importante do Judiciário
brasileiro.
A mordaça do regime ao STF só começaria a ser superada em 19
de janeiro de 1979, no final do governo do presidente Ernesto Geisel, que seria
sucedido por João Figueiredo, o quinto e último dos generais a comandar o país.
A Emenda Constitucional nº 11 revogava todos os atos institucionais e restituía
ao Supremo os seus poderes. O papel do STF seria fundamental no apoio aos novos
rumos jurídicos do país.
Mais de três décadas depois, em solenidade do então
presidente Fernando Henrique Cardoso, em 2 de dezembro de 2002, os três
ministros do Supremo cassados foram restituídos de suas condecorações
militares, retiradas na aposentadoria compulsória. Apenas Lins e Silva pôde
receber a medalha, uma vez que Nunes Leal e Hermes Lima já haviam morrido, em
1985 e 1978, respectivamente. Fundador do Partido Socialista Brasileiro (PSB) e
membro da Academia Brasileira de Leras (ABL), Lins e Silva faleceria duas
semanas depois, no dia 17 do mesmo mês. “Jurista da democracia” foi o título do
GLOBO no dia seguinte ao seu sepultamento, que fora acompanhado por
personalidades e políticos, entre eles o recém-eleito presidente Lula.
* com edição de Gustavo Villela, editor do Acervo O GLOBO
Juristas. Hermes Lima (à esq.) passa o comando do Ministério
das Relações Exteriores a Evandro Lins e Silva: após AI-5, aposentadoria
compulsória no STF
Juristas. Hermes Lima (à esq.) passa o comando do Ministério
das Relações Exteriores a Evandro Lins e Silva: após AI-5, aposentadoria
compulsória no STF 20/06?
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http://acervo.oglobo.globo.com/fatos-historicos/criado-em-1890-stf-sofre-cassacao-na-ditadura-apoia-redemocratizacao-16197190#ixzz4LlmFVNfY
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