sábado, 12 de setembro de 2015

O Leopardo

 “‘Veja bem, dom Pietrino, os ‘senhores’, como você diz, não são fáceis de compreender. Eles vivem um universo particular criado não diretamente por Deus mas sim por eles mesmo durante séculos de experiências especialíssimas, de fadiga e alegria deles; possuem uma memória coletiva no mínimo robusta e assim se perturbam ou se alegram por coisas que para você ou para mim não significam nada mas que para eles são vitais porque se relacionam com esse patrimônio de recordações, de esperanças, de temores de classe. [...] E com isso não quero dizer que são maus: é outra coisa. Eles, na verdade, são diferentes [...] Talvez por isso pouco se importam com coisas que para nós tem valor; quem está nas montanhas não se preocupa com os mosquitos da planície e quem vive no Egito chega a esquecer que existe guarda-chuva. O primeiro, porém, teme as avalanches os crocodilos, coisas que no entanto nos preocupam pouco. Para os aristocratas surgiram novos temores que nós ignoramos: já vi Dom Fabrizio, ele que é um homem sério e sábio, ficar enraivecido por causa de um colarinho mal passado a ferro; e ouvi dizer que o príncipe de Làscari não conseguiu dormir uma noite inteira de tão furioso que ficou por terem lhe dado o lugar errado num almoço na intendência.’” (Tommasi di Lampedusa, em O Leopardo)

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