O que eu vi sobre os haitianos e senegaleses que chegaram em
Santa Catarina é bem diferente de coisas que tenho lido e ouvido sobre eles. O
que eu vi: homens, em sua maioria, fortes, que parecem saudáveis, dispostos a
trabalhar. “Em qualquer coisa”, eles dizem. “Queremos emprego, educação,
qualidade de vida”, dizem outros. “O Brasil é uma terra de oportunidades”,
afirmam os que estão aqui há mais tempo e os receberam. Ainda sobre o que eu
vi: vi pessoas que sabiam o que estavam fazendo. Que não chegaram aqui com o
objetivo de “sugar” o estado, viver de favor, “roubar nossos empregos” (até
porque há empregos para elas. Informe-se). Vi pessoas que, aparentemente, não
são movidas por esse radicalismo absurdo. Mas também vi coisas que me chocaram:
o olhar para o chão, o medo, vergonha, insegurança, não sei ao certo, de
encarar os que aqui vivem nos olhos. Parece ingenuidade, parece respeito,
parece educação. Mas a mim, pareceu um sinal de subserviência de alguém que se
coloca numa condição inferior aos que ali estão. E isso, obviamente, não é uma
escolha deles ou um traço de sua personalidade. Pode até ser, e eu preferia que
assim fosse, mas me parece um sintoma. Sintoma de gente que já não foi tratada
como gente. Que já foi mal tratada, repudiada, desprezada. De gente que vê
nesse comportamento uma chance de sobreviver aqui, “sem atrapalhar”, “sem se
impor”. E isso me dói, sabe? Imaginar que se colocar numa condição de
inferioridade é estratégia de sobrevivência. Talvez nem seja assim, mas eu
tenho medo que seja. Porque imagino o que causou isso. E causar isso nos torna
menos humanos. Hoje eu ouvi um comentário sobre os haitianos e senegaleses que
era o seguinte: “tem que mandar ‘isso’ aí pra Brasília”. “Isso?”, me pergunto.
Por que usar uma palavra que dê a eles a condição de objeto, de bicho, e não de
gente? Mesmo que, na frase, o autor deste absurdo tivesse substituído o “isso”
por “eles”, ainda assim seria triste. Porque “mandar pra lá” os coloca mais uma
vez em condição de objetos, de algo que não tem capacidade para escolher. E é o
contrário daquilo que eu vi: eles sabem o que querem, sabem o que estão
fazendo, precisam de ajuda, mas estão fugindo de uma realidade que mesmo que a
gente queira, aqui, de longe, sem sentir na pele, jamais seremos capazes de
entender. Eu só queria que da mesma forma como somos rápidos em julgar,
expulsar, separar “eles” de “nós”, fossemos capazes de acolher. Lembrar o
passado, a história. Pensar que nossos avós, bisavós, já foram “eles” também,
talvez até “isso” pra uns. E se nada disso for capaz de te fazer ter o mínimo
de empatia por aquelas pessoas que agora chegam aqui, procure ajuda. Porque o
"isso", essa "coisa" vazia, sem alma, sem coração, me
parece ser você.
por Stefani Ceolla
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