quarta-feira, 13 de julho de 2011

Quatro sonetos cardinais

Maria da Conceição Paranhos

1.

Rosa e ouro se mesclam no teu sexo,

tão gaia espera, confundindo a busca

da flor cilíndrica que tens no púbis.

Quanto me atinges, seta no meu peito?

Colho teu sumo em corpo tão trançado

ao teu enlevo, que me rouba o fôlego,

enquanto o brilho dos teus olhos sádicos

esmaga minha boca a insano sorvo.

Tento dizer-te do tremor da casa,

mas só entendes do ganir do lobo

em minha toca a estertorar de gozo,

a trucidar-me com tua adaga em chama,

menos espero, e já me emborcas, louco.

O meu deleite a ti te adentra. Amas?

2.

Mor ventura não há neste meu fado

do que mirar teu corpo e usufruí-lo,

pausadamente, a mão a desvesti-lo,

saboreando teu olhar de dardos,

enquanto sofres com meu gesto lento –

ânsia mortal qual susto em punho destro,

mas à sinistra teço-te uma festa,

deslizando sussurros no teu peito.

Levo tua mão a cada poro intacto:

recobras-me novel e me entrelaças

com vendaval de sons em presto tato.

Cobra no bote, tuas coxas presas,

enrodilhado em meus joelhos altos,

danças e lanças seta no meu alvo.

3.

Quero teu corpo quanto quero à chave

retorcer-se em estreita fechadura.

Quando tu tranças tua pele tersa,

exibes nervo e músculo, arma-dura.

Que me estarreces! Miro, deslumbrada,

a ruga tesa e tensa da procura

do rego rijo onde te largas, ávido,

galopando as campinas da luxúria.

Dorso e penugem vejo-te. E revejo

o teu espelho, que a memória é falha.

Teu desatino encontro, meu amigo,

gesto lúbrico, inchado de desejo,

e, sábia mão, tu me abres como a livro

inda não lido, prenhe de tuas marcas.

4.

Teu dormir só suscita meu desejo,

pois eu, então, vejo tua chama insone –

corcel insano em desandado trote,

que me galope enquanto ainda sonho

com toda a lava que nos cobre e me arde

em fronha de cetim que se entreabre

ao corpo túrgido, encerrado, dentro,

rasgando a pele – em gana transformado,

rugindo rouquidão. Mucosa ávida,

escancarando-se a teu beijo álacre,

cortante gládio a lacerar-me o gáudio.

Com lassa boca, plena de alvoradas,

eu te derroto quando, exausto, tombas,

e eu te profano com meu terno afago.

(Maria da Conceição Paranhos. De As Esporas do Tempo. Salvador: Fundação Casa de Jorge Amado / COPENE, 1996. Prêmio COPENE de Cultura e Arte)

Nenhum comentário: