quarta-feira, 21 de agosto de 2019

Quinze anos da Lei de Arbitragem



  
É imprescindível que se desenvolva uma cultura da arbitragem em nosso país, para que a lei também possa ser corretamente aplicada

Um dos objetivos do processo de modernização é a diminuição da tutela do Estado e o consequente aumento dos poderes da cidadania.

Importante em termos de mudança social, embora pouco percebida pela própria sociedade, essa transformação é essencial, pois trata de criar mecanismos de proteção e garantias individuais que se conformem, não só sob o ponto de vista jurídico mas também sob aspectos econômicos e sociais, com o pleno exercício dos direitos humanos.

Exemplos significativos encontram-se no Código de Defesa do Consumidor, nos Juizados Especiais Cíveis e Criminais e no Estatuto da Criança e do Adolescente.

Ademais, em 2004, foi promulgada a emenda constitucional nº 45, dispondo sobre a reforma do Judiciário e que ensejou, em consequência, a aprovação de novas leis processuais que concorreram para o melhor funcionamento de nosso poder judicante.

Agora, estamos comemorando o 15º aniversário da lei nº 9.307, que dispõe sobre arbitragem e cujo projeto tive a iniciativa de apresentar ao Senado Federal em 1992.

Naquela ocasião, observei que o texto, caso aprovado, iria significar o aparecimento de uma instância alternativa à prestação jurisdicional por parte do Estado.

Há no Brasil uma demanda da sociedade direcionada no sentido de tornar mais célere a prestação jurisdicional, pois, como ressaltou Rui Barbosa, em sua sempre recordada "Oração aos Moços", "justiça atrasada não é justiça, e sim injustiça qualificada e manifesta".

Se tal representa um estorvo para as partes, não deixa de constituir, igualmente, um tormento para os advogados e uma preocupação para os magistrados, que vivenciam o crescimento geométrico das lides. A arbitragem, conquanto seja instituto que só agora está sendo exercitado entre nós, não é algo novo em nosso Direito positivo legislado.

Basta lembrar o artigo 160 da Constituição de 1824, prevendo que, em causas cíveis e penais, civilmente intentadas, poderiam as partes "nomear juízes árbitros", cujas sentenças seriam "executadas sem recursos, se assim o convencionarem ambas as partes".

Frise-se, ainda, o fato de a arbitragem ter permanecido letra morta nas práticas jurídicas brasileiras, apesar de estar prevista no Código Civil que vigorou de 1917 a 2002.

Esse hábito não pode ser imputado à falta de tradição do instituto em nosso Direito, mas à disciplina da matéria, que subordinava a arbitragem à homologação judicial.

Carecia-se, portanto, de provisão legal que desse a esse instituto, tão amplamente usado em outros países e no Direito internacional público, eficácia jurídica integral.

As vantagens que oferece sobrelevam de muito os processos jurisdicionais estatais: quer pela celeridade do rito escolhido, quer pela especialização dos árbitros, mediante a faculdade de se escolherem os experts na referida matéria; quer pelo sigilo, quando tal se impõe; quer pela flexibilidade dos atos procedimentais; quer pela menor onerosidade dos custos; quer pela exequibilidade das decisões arbitrais, como títulos executivos que são.

É de todo necessário, entretanto, que se continue a apoiar o sistema de arbitragem em nosso país.
Para tal fim, é imprescindível que se desenvolva uma cultura da arbitragem, para que a lei seja não apenas adequadamente apreendida pela sociedade, mas também corretamente aplicada.

MARCO MACIEL é membro da Academia Brasileira de Letras. Foi vice-presidente da República (1995-1998 e 1999-2002), ministro da Educação (governo Sarney), senador e governador de Pernambuco (1978-1985).

 FSP.12 Oct 2011

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