terça-feira, 18 de agosto de 2015

Afinal, o que raios é “fascismo”?


17/08/2015   Flavio Morgenstern

Texto publicado na edição impressa da Gazeta do Povo de 17 de agosto de 2015

Nenhuma palavra é mais usada no vocabulário político do que “fascismo”, e nenhuma parece mais apartada da realidade. Vendo os discursos de políticos, jornalistas e intelectuais no Brasil, parece que sairemos à rua e nos depararemos com camisas negras, glorificações a Mussolini e exigências de tudo ser colocado dentro do Estado, nada fora do Estado, nada contra o Estado. Na vida real, não vemos nada disso. Aliás, vemos o último: mas quem pede a estatização total da vida são justamente os que mais acusam os outros de fascistas.

Isso tem explicação. Lew Rockwell já alertou, em A ameaça fascista, que nenhuma outra palavra é mais pesada no vocabulário político. “Fascismo” é visto como o mal em si, algo que une a direita e a esquerda em seu repúdio. Entretanto, ao se pedir para as mesmas pessoas que detestam fascistas que descrevam o sistema político que defendem, muitas acabarão justamente defendendo o fascismo.

Sobretudo graças ao Holocausto promovido pelos nazistas, espécie de ultrafascistas, a narrativa histórica parece apenas promovê-los como assassinos desmotivados. Pelo contrário: o genocídio fascista do século 20 tinha profunda base filosófica – o que é uma violência ainda mais perigosa. E esta base continua movendo corações e políticas mundo afora.

O grosso do fascismo é justamente o que é defendido pelos supostos “críticos”, que adoram chamar seus adversários de fascistas


O jornalista John T. Flynn analisa os pontos que definem um governo fascista. O governo é totalitário, pois desconhece limites para seu poder. É uma ditadura, baseada no princípio da liderança. Permite algum mercado, mas atolado numa imensa burocracia. A economia é cartelizada e controlada por sindicatos. O planejamento econômico é baseado no princípio da autarquia. O governo se sustenta com gastos e empréstimos. Os gastos são sobretudo militares, e com fins imperialistas. Excetuando-se estas últimas definições, nada muito diferente do sistema atual do Brasil, por exemplo. Para subir ao poder, fascistas disputam eleições livremente, e logo começam com conchavos com empresários que aceitem trocar a livre concorrência no mercado por monopólios com o Estado. Familiar?

Tentar encarar o fascismo apenas pelo militarismo tampouco convence. Fascistas promovem amplas campanhas de desarmamento para concentrar o poder nos líderes do Estado. Parece com os militares brasileiros ou com seus críticos, hoje no poder?

O coletivismo é a tônica, com total subordinação das liberdades individuais – seja ter uma opinião, escrever em um jornal ou criar uma empresa e lucrar o quanto quiser – aos ditames de um Estado total, com um planejamento central. Parece mais algo de “coxinhas” ou justamente dos progressistas atuais?

Na narrativa típica, vemos o fascismo por seus aspectos periféricos. Na realidade, o grosso do fascismo é justamente o que é defendido pelos supostos “críticos”, que adoram chamar seus adversários de fascistas. Inclusive os judeus, as maiores vítimas dos fascistas, foram vítimas justamente por serem a “burguesia”, a elite de hoje.

Xingar um fascista de fascista não ofende. Todavia, chamar alguém que repudia o fascismo disso ofende. Sem perceber, ao chamar tudo de “fascista”, progressistas não percebem que provam que os liberais são radicalmente adversários do fascismo.


Flavio Morgenstern é analista político e autor de “Por trás da máscara – do passe livre aos black blocs”.

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