quinta-feira, 21 de agosto de 2014

O fascismo do século XXI


Saragoça da Mata.....Jornal I...15 de agosto de 2014


"Quando se entrega o poder a demagogos e charlatães (?), as instituições constitucionais e democráticas desaparecem tão depressa como a confiança nas autoridades porque já ninguém acredita nelas"1
Um dos importantes livros escrito no novo milénio é uma pequena obra de apenas 78 páginas com o título "O eterno retorno do fascismo". O seu autor é um escritor Holandês: Rob Riemen. O pensamento que Riemen verteu nessa obra pode suscitar discordâncias no que respeita à origem do fenómeno que analisa. Mas há uma questão relativamente à qual nenhuma dúvida pode remanescer seja em quem for: é na acuidade da análise feita por Riemen ao momento cultural que vivemos. E consequentemente no acerto da leitura que apresenta sobre o estado calamitoso (numa perspectiva de evolução da civilização e de tutela dos direitos humanos) da política europeia e mundial.

É um livro que se devora em poucas horas, sem se imaginar que se revisitará vezes sem conta. Com efeito, a cada nova convulsão internacional, cabe reler Riemen. A cada nova crise política portuguesa, impõe-se conferir Riemen. Perante o conhecimento do que fez a política e o poder económico em Portugal nas últimas décadas, não pode deixar de se reler Riemen. A cada novo anúncio do governo em matéria de "cortes", lá nos vem Riemen ao pensamento. E com ele, Robert O. Paxton, autor da obra "A anatomia do fascismo", de 2004, que Riemen cita.

E porque é sempre melhor ler o original do que uma tímida recensão que triangule o pensamento do autor, peço ao leitor que julgue por si mesmo:

a) "... no século XXI, nenhum fascista se designará a si próprio como tal. (...) o fascismo, devido à sua angustiante falta de ideias e ausência de valores universais, assumirá sempre a forma e as cores do seu tempo e da sua cultura. (...). A técnica usada é idêntica em toda a parte: um líder carismático, populista, para mobilizar as massas; o seu próprio grupo é sempre vítima (das crises, da elite ou dos estrangeiros); o ressentimento orienta-se todo para um 'inimigo'. O fascismo não necessita de um partido democrático cujos membros sejam individualmente responsáveis; necessita de um líder inspirador e autoritário ao qual se atribuem instintos superiores (...). O contexto em que esta forma de política pode dominar é o de uma sociedade de massas afectada pela crise que ainda não aprendeu as lições do século XX" (pp. 72-73);

b)"Quando se entrega o poder a demagogos e charlatães, que usam os mass media para cultivar a crença de que esse líder (...) é a única pessoa capaz de salvar o país, as instituições constitucionais e democráticas desaparecem tão depressa como a confiança nas autoridades porque já ninguém acredita nelas" (p. 71).

"O eterno retorno do fascismo" é uma obra de tal dimensão que deveria ser-lhe consagrada leitura obrigatória e acompanhada em todos os canais televisivos nacionais à mesma hora do mesmo dia de semana, assim tentando"obrigar" os telespectadores a ouvir o que Riemen escreveu... para ver se acordam a tempo de exercer a soberania que o Direito diz caber-lhes. Ou então, mais alienadamente, fazerem zapping para a Sport TV ou jogarem Candy Crush, porque viver sem pensar é seguramente menos doloroso!

1 Rob Riemen, O eterno retorno do fascismo, Ed. Bizâncio, Lisboa, 2012, p. 71.


Advogado

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