terça-feira, 1 de abril de 2014

Emigração 71


A mulher de um marinheiro trucidado conta ao pai de uma menina presa, aguardando julgamento, a depressão nervosa de um amigo comum, deputado federal, que agora vive no Chile. Será que o Allende vai dar certo... As chicrinhas vão pela sala, de mão em mão, há uma bandeja de bolo e outra de doce de leite. Lá fora, imensa e silenciosa, a dança fantástica do outono incendeia a tarde fria. O garoto brincando no tapete já nasceu em Paris. Aqui e ali o murmúrio é interrompido por uma expressão mais nortista. Um menino loiro, que participou no rapto dalgum embaixador, pede açúcar para pôr no chá. Na vitrola, Caetano canta a sua versão da Asa Branca. Todos ficam quietos.

roberto schwarz, em 26 poetas hoje (org. de Heloísa Buarque de Hollanda)

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