quinta-feira, 1 de novembro de 2012

A Função do Amor é Fabricar Desconhecimento




a função do amor é fabricar desconhecimento

(o conhecido não tem desejo; mas todo o amor é desejar)
embora se viva às avessas, o idêntico sufoque o uno
a verdade se confunda com o facto, os peixes se gabem de pescar

e os homens sejam apanhados pelos vermes (o amor pode não se
importar
se o tempo troteia, a luz declina, os limites vergam
nem se maravilhar se um pensamento pesa como uma estrela
— o medo tem morte menor; e viverá menos quando a morte acabar)

que afortunados são os amantes (cujos seres se submetem
ao que esteja para ser descoberto)
cujo ignorante cada respirar se atreve a esconder
mais do que a mais fabulosa sabedoria teme ver

(que riem e choram) que sonham, criam e matam
enquanto o todo se move; e cada parte permanece quieta:


pode não ser sempre assim; e eu digo
que se os teus lábios, que amei, tocarem
os de outro, e os teus ternos fortes dedos aprisionarem
o seu coração, como o meu não há muito tempo;
se no rosto de outro o teu doce cabelo repousar
naquele silêncio que conheço, ou naquelas
grandiosas contorcidas palavras que, dizendo demasiado,
permanecem desamparadamente diante do espírito ausente;

se assim for, eu digo se assim for —
tu do meu coração, manda-me um recado;
para que possa ir até ele, e tomar as suas mãos,
dizendo, Aceita toda a felicidade de mim.
E então voltarei o rosto, e ouvirei um pássaro
cantar terrivelmente longe nas terras perdidas.


E. E. Cummings, in "livrodepoemas"/
tradução de Cecília Rego Pinheiro



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