quarta-feira, 28 de julho de 2010

Orlas

Parou diante de uma água pingando-sem nada enxergar na noite encoberta.Era só pelo ouvido que recebia as gotas caindo.Pensou até em cegueira repentina, mas nisso não se fixou, preferindo soletrar seu nome, ou melhor, um outro que vinha repetindo havia dias, pelo belo prazer de ter a boca ocupada com uma coisa que não ancorava de chofre num sentido: pura passagem de ar, que ele às vezes abortava mordendo, mastigando, engolindo, devolvendo pela boca aos pedacinhos ele ainda falava no clarear do dia , enquanto a gota já longe silenciava...Silenciava dissolvendo-se no nevoeiro que impedia o avião de decolar. Encostado no aramado do aeroporto, ele tocava no limite , repetindo um nome que não era bem o seu , e sem parar...

João Gilberto Noll
Relâmpagos.Folha de São Paulo.09/07/2001

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